Saiba o que é a Medida Provisória (MP) 1.045

Os impactos da MP 1.045 nas relações de trabalho Por Dra. Zilmara Alencar

Dra. Zilmara Alencar

Muito se fala sobre a Medida Provisória (MP) 1.045/21 votada no dia 10 de agosto de 2021 na Câmara dos Deputados. Mas o que de fato ela abarca? Vamos conhecer um pouco mais sobre o Projeto de Lei de Conversão? O texto-base da MP instituiu o Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda nas hipóteses de suspensão temporária do contrato de trabalho ou redução proporcional de jornada de trabalho e de salário. Ocorre que, além das disposições relativas à implementação do programa, o relator da proposição, deputado Christino Aureo (PP-RJ), apresentou parecer às emendas de Plenário, nas quais foram acrescidas ao texto alterações com significativo impacto no âmbito das relações individuais e coletivas do mundo do trabalho. 

“Segunda classe” 

Entre os pontos, destacam-se, principalmente, o Regime Especial de Trabalho Incentivado, Qualificação e Inclusão Produtiva (Requip) e o Programa Primeira Oportunidade e Reinserção no Emprego (Priore). O Requip cria uma espécie de trabalhador de “segunda classe”, sem contrato de trabalho e, portanto, sem férias, FGTS, contribuição previdenciária, entre outros direitos. O programa fixa uma duração de três anos para pessoas de 18 a 29 anos; pessoas sem vínculo registrado em Carteira de Trabalho há mais de 2 anos e pessoas de baixa renda oriundas de programas federais de transferência de renda. Trata-se de prestação precarizada de serviços ou trabalho eventual disfarçada de formação profissional para afastar a caracterização de relação de trabalho. Ou seja, é prestação de serviços disfarçado de formação profissional, com assinatura de um termo de compromisso, mas sem caracterizar relação de trabalho. Nem salário será oferecido ao profissional contratado, mas algo intitulado de Bônus de Inclusão Produtiva (BIP) e de Bolsa de Incentivo à Qualificação (BIQ).

CLT

No tocante às alterações da CLT, há propositura de mudanças quanto a fiscalização do trabalho, a duração do trabalho em minas de subsolo, os prêmios concedidos pelo empregador, a homologação de acordo extrajudicial perante a Justiça do Trabalho, o exame pericial em ações previdenciárias relativas à assistência social e os programas de alimentação do trabalhador. Na questão financeira previdenciária, o projeto de lei de conversão da MP estabelece ainda a possibilidade de acumulação do Benefício Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda (BEm) com o benefício de prestação continuada de que trata o LOAS (Lei nº 8.742 de 1993), pelo trabalhador aprendiz com deficiência, bem como possibilita o trabalhador com contrato de trabalho suspenso contribuir como segurado facultativo, mas conforme as alíquotas estabelecidas para o segurado obrigatório.

“Jabutis”

Ante ao exposto, percebe-se que o texto base da MP 1045 foi acrescido de inovações jurídicas que impactam direta e negativamente os direitos trabalhistas. Tais inserções são popularmente chamadas de “jabutis”. Em primeiro plano, observar-se-á a irregularidade formal desta alteração, pois o STF já decidiu que “a prática da inserção, mediante emenda parlamentar no processo legislativo de conversão de medida provisória em lei, de matérias de conteúdo temático estranho ao objeto originário da medida provisória, viola a Constituição Federal” (ADI 5127, Rel. Min. Rosa Weber, Rel. p/ Acórdão Min. Edson Fachin, Tribunal Pleno, julgado em 15/10/2015).

Minirreforma

Assim, matérias não diretamente relacionadas ao objeto da MP deveriam ser apreciadas em propostas legislativas específicas, que permitiriam amplo debate nas Casas do Congresso Nacional. Ocorre que, conforme tópico anterior, do mérito, fizeram uso da medida provisória para realizar uma minirreforma trabalhista, com a modificação de dispositivos celetistas que vão resultar na redução dos direitos do trabalhador. 

Má-fé

Outrossim, há violação da alínea “b” do inciso I do art. 62 da Constituição Federal que veda, expressamente, a edição de medidas provisórias sobre Direito Processual Civil, quando disciplinam, por exemplo, requisitos para a concessão da gratuidade da justiça, implementam novas possibilidades de litigância de má-fé e alteram disposições relativas ao processo de jurisdição voluntária para homologação de acordo extrajudicial.

Transgressão

No que cerne o âmbito material do PLV, com a implementação do Requip e do Priore, seria consubstanciada literal transgressão a direitos consagrados nos incisos do art. 7º da Lei Maior, bem como em seu art. 227, que insere, entre os aspectos do “direito a proteção especial” do adolescente e do jovem, a “garantia de direitos previdenciários e trabalhistas”. Os maiores impactos serão para os contratos de aprendizagem profissional, tendo em vista que há permissão para que o jovem em situação de vulnerabilidade ou risco social incluído no Requip seja “contabilizado para efeito de cumprimento da cota obrigatória de aprendizagem”. Válido ressaltar que malgrado as modalidades de trabalho em comento tenham sido criadas, há fundado risco de haver, em verdade, mera dispensa de trabalhadores atuais, com substituição por outros com menos direitos e que, assim, geram menos custos, pois a PLV não prevê a impossibilidade de substituição da classe empregada.

Motta

O Deputado Federal Luiz Carlos Motta, presidente da Fecomerciários/SP e da Confederação Nacional dos Trabalhadores do Comércio (cntc) se manifesta de forma contrária à referida medida, uma vez que, embora o objetivo social seja relevante, ao renovar o programa de redução ou suspensão de salários e jornada de trabalho com o pagamento de um benefício emergencial aos trabalhadores, o resultado disso não irá aumentar a oferta de empregos, mas sim promover um corte brutal nos custos do trabalho e ampliar significativamente as margens de lucro das empresas. O que era para ser uma lei para incentivar a geração de empregos durante a pandemia da Covid-19 foi transformada numa continuação da Reforma Trabalhista de 2017, com mais precarizações à classe trabalhadora.

Confira video e Carta aberta da UGT-SP aos Senadores sobre Medida Provisória (MP) 1.045